WIKIS E O HIPERTEXTO COLABORATIVO
O
avanço das tecnologias da comunicação e informação (em especial a internet)
oferecem novos espaços para interações discursivas, fazendo com que a leitura,
redação ou edição de um texto seja resultado de uma interação sociocultural, ou
seja, a produção e a conclusão do texto depende da relação estabelecida pelos
interlocutores.
Ao
se discutir o fenômeno dos wikis, faz-se necessário contextualizarmos a
discussão sobre o conceito de hipertexto. Que para alguns autores hipertexto é
compreendido como uma forma de apresentação da informação, que permite ao
leitor um acesso ao mesmo tempo fragmentado e articulado a outros trechos do
texto, o que independe do suporte em que a informação é publicada.
Segundo
Marcuschi (2005, p.186) “o hipertexto não é um fenômeno do meio estritamente
eletrônico, ou exclusivamente do mundo digital” reafirma esta posição
relacionando que, uma enciclopédia em papel, portanto, pode ser considerada uma
produção hipertextual, uma vez que, ao final de cada um dos verbetes, são
feitas referências a outros fins que dão ao leitor a possibilidade de continuar
a leitura, ainda que o verbete esteja em outro volume da publicação.
Partindo
do ponto de vista acima citado, pode-se afirmar que não necessariamente o
hipertexto tem o mesmo funcionamento nos suportes impressos e digitais. Nestes,
especialmente na WWW, o hipertexto assume uma característica especifica: a
interconexão imediata entre os elementos associados pelo hipertexto, algo
tecnicamente inviável nos textos impressos e agora viabilizados através dos hiperlinks, ou simplesmente links. Esse recurso facilita a interação
de diferentes fontes de informação, ampliando e explicitando a natureza
intertextual que todo texto carrega em si.
A
possibilidade de “navegar” pelo texto, escolhendo, a partir de um menor ou
maior número de variáveis, os caminhos a serem percorridos através dos links,
impulsionou uma discussão sobre a possível mudança nos papéis distintos
tradicionalmente assumidos por leitores e escritores.
Um
modelo de produção de informações baseado na polarização entre escritores e
leitores, anteriormente o padrão na internet, vem aos poucos sendo rompido por
uma nova geração de sites denominada por O’Reilly (2005) de Web 2.0. Mais do
que uma revolução tecnológica, a Web 2.0 representa uma mudança na proposta
comunicacional dos sites, neste contexto, o leitor torna-se potencialmente um
interlocutor que interfere diretamente sobre o conteúdo apresentado pelo site.
Baseado
num ambiente Web, a principal característica de um sistema Wiki de publicação é
a possibilidade de qualquer visitante (cadastrado ou não), a qualquer momento,
alterar qualquer informação publicada em um artigo, bastando acessar a página
Edição vinculada a cada página. Imediatamente, a edição do texto é publicada e
será considerada a versão atual até que outro visitante altere o texto
produzido pelo usuário anterior. A mais famosa e bem sucedida experiência no
sistema wiki é a Wikipédia (WWW.wikipédia.org/),
uma enciclopédia “livre e aberta” que permite a edição por qualquer
interessado. A Wikipédia é um dos projetos mantidos pela Wikimedia Foundation,
responsável também por outras iniciativas em português, como o Wikicionário
(dicionário no qual os significados das palavras são escritos coletivamente), Wikilivros
e Wikinotícias (produção de livros e notícias, respectivamente).
O
software wiki possui diferentes versões disponíveis para download gratuito na
internet, o que permite que seja instalado em qualquer servidor e apropriado
para diferentes fins. Entre as centenas de wikis em funcionamento no mundo
atualmente, podemos destacar seu uso corporativo, por exemplo, o GMNext (http://gmnext.com/wiki/), mantido pela
General Motors, e o projeto Open Educacional Resources (http://oerwiki.iiep-unesco.org/),
proposto pela UNESCO.
Na
Wikipédia, assim como em outros sites baseados na ferramenta Wiki, os
colaboradores não tem direitos intelectuais sobre o texto, ao contrário das
regras que regem a produção textual em grande parte dos suportes impressos e
mesmo eletrônicos. Todo o conteúdo produzido na Wikipédia esta ligado a Licença
GNU de Documentação Livre, o que garante a livre reprodução e distribuição das
informações ali publicadas. O fato de os contribuintes não serem “donos” do
texto que co-produziram não significa, no entanto que sua participação seja
anônima. Toda colaboração textual aos artigos da Wikipédia é creditada ao
autor, fica armazenada na página História é associada ao número de IP do usuário
ou ao login criado pelo wikipedista. É importante destacar que os Wikis não são
a única plataforma disponível na internet que possibilita a produção coletiva
de conteúdos. Ao permitir que os visitantes comentem os posts, os blogs são
também ferramentas colaborativas, ainda que não seja possível interferir
diretamente na produção inicial do autor. A disseminação desse modelo de
produção colaborativa é registrada por Xavier (2005, p.4), que destaca o
“crescimento da participação de outros interlocutores na ‘composição coletiva’
e as vezes, simultânea de textos na internet como acorre com os chats (...),
bem como acontece com as hiperficções
colaborativas (...)”. Tampouco a produção coletiva de textos não foi
inaugurada pelos Wikis ou pela internet.
O
contexto social e as ferramentas tecnológicas da atualidade, no entanto,
oferecem condições para que este modelo de produção ganhe proporções jamais
vistas. Um sistema Wiki, acredita-se, é o que mais se aproxima de um novo
modelo de leitura e produção textual alardeado por vários estudiosos do
hipertexto. O sucesso da produção coletiva de textos a partir dessa ferramenta
depende essencialmente do engajamento dos usuários, que, conscientes das
possibilidades de intervir em um texto, devem sentir-se motivados para
consertar uma informação errada que tenha sido identificada, ampliar um texto
ainda em estágio inicial ou ainda editar um conjunto de frases desarticuladas,
buscando dar coerência ao texto. Como afirmamos em d’Andréa (2007:14), “ a
participação em sites da Web 2.0 tem também um caráter ético e político na
intervenção social”.
Referências:
Hipertextus
revista digital – artigo WIKIS E O HIPERTEXTO COLABORATIVO
Carlos
Frederico de B. D’ANDRÉA
Universidade
Federal de Viçosa (UFV)
Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG)